quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

"Mãe, tire o distintivo de mim*"



Pesam estes distintivos. Essas conceituações que colocam em nosso peito sobre "quem somos": CPF, Identidade, senhas, livros didáticos, resenhas de nossa própria vida contada por outro olhar, enquadradas em noticiários e retrospectivas que não trazem a nossa história, contada inteiramente, mas em uma edição do que, de fato, podemos ser.

Esse 'enquadramento' entre ajuste, desajuste, certo, errado. Entre Deus e o pecado. Entre a paisagem e o dia, contados em horas que o relógio diz se próprias ou não. Entre o bem e o mal, 

Mãe, tira o distintivo de mim?  Aqueles que fincam dentro da pele, como se me fizessem parte, enquanto sou mais para tempo nublado, luz,sombra, calma e tempestade. Não podem outros colocarem os distintivos que me cabem, se nem eu mesma saberia escolher na galeria da vida quais colocar sob a alma!

Ninguém é só mais um na multidão,mãe. Pessoas não precisam de distintivos. Elas já são distintas, cada uma à sua ilustre maneira e com suas ilustres ilusões. Elas só precisam seguir por seus próprios tijolos amarelos, em busca de seus sonhos.

Mas, se me puserem distintivos, que eu não esqueça quem sou e todas as dúvidas que me compõem, porque certezas queimam mais do que indagações. É de certezas que tantas tragédias e perdas vivem de acontecer todos os dias. Não, não está escuro e não vislumbro outra luz ou sombra que não seja a minha, e que assim seja,mãe! Que não o tempo não leve minhas falhas como poeira, antes, que eu seja responsável pelo processo de melhora, sem por isso precisar de medalhas, que a humildade seja um pouco mais interna a cada dia.

Que minha bondade seja maior que as minhas falhas e eu não faça de ambas  o meu distintivo como ser humano, porque é das multipolaridades que se faz uma pessoa. Mãe, não me deixa presa como senhor K, nem em busca de castelos que não existem, tampouco olhada sob holofotes eternos, perdida em 1984 ou nas vicissitudes de Doryan. São tantos personagens que me contaram suas vidas, e nem eles têm distintivos! Sempre me contam alguma coisa a mais. Por que então, em mim?

Quer saber, mãe? Não tire os distintivos de mim.
Deixa que eu mesma faço isso.


(Do trecho da canção de Zé Ramalho: "Batendo na Porta do Céu", um devaneio)

Bom dia! =)

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