terça-feira, 17 de outubro de 2023

Paralelismo Sentimental Viciante (Devaneio do Boteco da Lua)








Foi em uma das muitas madrugadas em que estou de papo com Bel. Ouvi esta versão antiga , interpretada pela Vanusa, da canção "Paralelas'', com a frase 

" E as borboletas do que fui pousam demais
Por entre as flores do asfalto em que tu vais..."

Fiquei curiosa  e quis compreender o motivo de trecho da canção ter sido modificado. Primeiro, porque o poema ganha ainda mais sentido, com o trecho retirado, que aliás, poderia ter sido perfeitamente agregado ao verso que o precedeu "Como é perversa a juventude do meu coração / Que só entende o que é cruel / e o que é paixão".


Explico. É que, "'Paralelas'', para mim, sempre evocou o inevitável sentimento de solidão de Belchior, frente aos conceitos propagados nas grandes cidades, o da 'multiplicação', 'riqueza', assim como o registro do eu lírico do poeta, em contraposição a estes conceitos, esvaziados de emoção.

Parecia-me uma declaração de Bel sobre o peso do capital e seu preço sobre as relações afetivas. Bom, acontece que,  com o ''novo'' verso em mente, tive a curiosidade de perguntar o porque 'as paralelas dos pneus na água das ruas são duas estradas nuas...' e porque a música ganhou o título 'Paralelas'.

Como sabemos, nosso poeta misturava conceitos físicos, filosóficos, astrológicos, poéticos e sim, matemáticos e geométricos para falar de emoção. Então, eis um conceito geométrico simples de 'Paralelas':

Uma Reta é uma sucessão infinita de pontos, situados todos em uma mesma direção, no entanto, essa sucessão se caracteriza por ser contínua e indefinida, portanto, uma reta não tem nem inicio nem fim; junto ao plano e ao ponto, a reta é um dos elementos geométricos fundamentais. E a paralela é um adjetivo empregado para referir-se àquilo que é semelhante, correspondente, ou que já foi desenvolvido em um mesmo tempo.
Então, as retas paralelas são aquelas retas encontradas em um mesmo plano, apresentam a mesma inclinação e não apresentam nenhum ponto em comum; isto significa que não se cruzam, nem se tocam e nem sequer cruzam suas prolongações. Um dos exemplos mais populares é o das vias de um trem. (Artigo http://queconceito.com.br/retas-paralelas)

Foi então que compreendi que Belchior falou  de solidão, do preço cobrado pelos conceitos moderníssimos das grandes capitais, mas também, de si e de um outro alguém, um sentimento pessoal, comparando-os à linhas paralelas, que embora similares, por serem retas, não se cruzavam. 

A letra fez mais sentido e a solidão do poeta,também. Mesmo a canção teve seu momento de íntima verdade do emocional do amor que mora dentro daquela canção: "Dentro do carro/ Sobre o trevo/ A cem por hora, ó meu amor/ Só tens agora os carinhos do motor.../ E no escritório em que eu trabalho / E fico rico/ Quanto mais eu multiplico/ Diminui o meu amor..."



Cada uma das retas vivenciava sua própria aceleração, diferenciadas, parecidas, paralelas. De refletir sobre isso, acabei por relacionar ao vício pós-moderno, tão explorado em Bauman, sobre o fim das comunidades e a era das 'redes': menos encontro e mais paralelas. Parece viciante e solitário...

Por outro lado, percebi que confundo paralelas com linhas encontradas. Preciso corrigir alguns poemas (e emoções), onde entendo 'paralelas' no sentido de 'cruzamento',graças ao déficit de atenção geográfico/geométrico/espacial/emocional.

Bom, como não sou matemática ou física, me perdoei e fui atrás de saber o avesso ao conceito de paralela, ou seja, quando as linhas se encontram. Descobri que é chamado de 'interseção', cujo significado é:


O conceito interseção pode ser utilizado em nosso idioma com dois sentidos diferentes. De um lado, é utilizado no campo da geometria para designar aquele ponto estabelecido em que se cruzam duas linhas. Também serve para indicar o encontro entre duas linhas, planos ou objetos.Mas sem dúvida é no trânsito onde mais se usa esse termo, mesmo assim não podemos esquecer que sua utilização é resultado direto de sua referência apresentada na geometria.
Basicamente a interseção no trânsito se refere ao cruzamento de duas ou mais ruas. Sua principal função é possibilitar o acesso de quem circula à outra via e assim chegar ao seu destino.  Artigo http://queconceito.com.br/intersecao

Bom, quer mais poesia do que isso? Tome algumas taças de vinho e leia este texto, ao som de paralelas. Se a interseção é o encontro, falta ao mundo e a cada um de nós o charme do alinhamento sentimental. Mas isso envolve o conhecimento da geografia interna  e não é fácil reconhecer nossos espaços. É a árdua tarefa que viemos fazer por aqui... e tem tanto a ver com o amor!

Bom, o meu desejo após desta longa digressão em Belchior é que, depois de caminhar comigo pela canção "Paralelas",  um pouco do paralelismo sentimental viciante - doença do coração que esta poeta aqui inventou - seja curado de dentro de seu coração. Que explores dentro de você o que é um estar em par e esteja  ávido por um amor interseção, que te leve ao  encontro! - Com o seu destino.


LUZ!!! 
LUZ!!!
LUZ!!!

*Republicado, porque o texto foi acessado e gostei muito de ter escrito isso...e porque ainda é tudo em que acredito.

2 comentários:

  1. As linhas paralelas se encontram no infinito. "Teu infinito sou eu"

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    1. Essa é uma dúvida (matemática e geométrica). E até mesmo poética, Letícia. Mas a referência é ...lindíssima! <3

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