Uma das lembranças mais doces de
ser criança de uma cidade do interior do norte é a alegria e o contato íntimo
com a natureza e a sabedoria mística que envolve as coisas da floresta.
Coisas como Chá de Cidreira para
cólica e sono de criança, erva doce e hortelã para digestão, mastruz para
vermes, enfim…tantas ervas e raízes! Tive mais contato com este tipo de remédio
do que com fármacos, propriamente. Conto isso com grande alegria e pretendo
que, se Deus permitir, transmitir esta sabedoria de avós a netos, vida
afora.
Outro remédio que minha mãe
costumava dar era um líquido profundamente adocicado, enjoativo, para tudo que
era doença ou male: caiu, ralou o joelho? santo elixir misterioso em ação. Dor
de cabeça para não ir para a escola? dor de barriga sem febre? santo elixir! Muitos
anos depois, soube que era água com açúcar. Ao que parece, muitas vezes, fui
curada através da medicina mais profunda que uma criança pode receber: palavra
de mãe de que a dor vai passar.
Meu pai, por outro lado, era
cheio de frascos diferentes, do tipo que raramente vemos hoje. Como por
exemplo, o ‘delicioso’ elixir paregórico, 40 gotas que curavam TUDO que uma
criança ou adolescente pudessem contrair. Isso trouxe a lembrança de que Rubem
Alves, uma das minhas grandes referências literárias nacionais, escreveu sobre memórias e remédios de infância em uma crônica (do qual esta provavelmente é filha tímida), que fala da saudade do gosto ruim do Elixir de Nogueira, remédio que tinha gosto de peixe e do qual tanto sentiu falta. Rubem ainda rememora que a expressão elixir é de etimologia árabe, interligada ao conceito de Alquimia...
E a expressão ‘panos quentes’? aprendi
depois de adulta para que servem (Ufa!). Aliás, sobre a dor, minha so(l)brinha,
tinha receios diferentes dos meus. Ela não temia o instante, mas sim o medo de não sarar. Chorava pedindo para ‘tirarmos’ o dodói dela…ah!
Quem nos dera se Deus nos tivesse dado o santo poder de sermos heróis de nossas
crianças…
Infelizmente ou felizmente, o
tempo nos alcança e quanto mais corremos, mais ele passa. Hoje há comprimidos
para solidão, tristeza, insônia, coração partido. Farmácias crescem e se tornam
cada vez mais essenciais à rotina das cidades. São os estudos e a evolução de outras formas de compreender o mundo, essenciais à melhoria da qualidade de vida, mas confesso que sinto saudades da
sabedoria simples que a tudo curava.
Confesso que ainda tomo chás,
alguns do jardim, alguns de espera (ah! paciência!), outros de sabedoria, paz…outros
em sachê, quando a pressa não deixa ir à feira maluca, ou quando a vida acelerada me distancia deste hábito tão bom que é sentir a delícia das
ervas frescas...
É que mora em mim a mágica
daquele elixir adocicado e das 40 gotinhas que curavam qualquer dor, de caber dentro do
colo dos meus, num abraço apertado que ainda garante, dentro do meu peito, que para meu grande alívio, tudo, qualquer dor … vai passar!
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