Deve ter havido algum engano, porque em algum lugar do planeta, dizem por aí que um ser elementar mudou de rota: saiu de um espaço existencial para outro, sem deixar de ser e estar.
Não, não falo de uma deidade.
Falo de um tipo diferente de criação: Um tipo muito humano
mesmo de gente, que alegra a toda forma de Criador. Gente macia que, uma vez a cada trilhão
de existência, a eternidade deixa vir para a matéria, por um tempo (in)finito,
para partilhar conosco, os que por aqui ainda vagam.
Gente macia é tão difícil de encontrar...lá, do outro lado,
eles são ‘os elementares’.
Não confundi-los com divindades, os elementares nunca
poderiam parecê-las, pois são cobertos de uma humanidade latente, ambiguidades
que perfazem o ser complexo e natural.
Aliás, tão naturais que foram criados da mistura particular
não da água e do barro, mas de todos os elementos, daí serem ‘por lá’
conhecidos como elementares. Foram feitos compostos do ar, da água, do sal da
terra, feitos pelas mãos da mistura de todos os tipos de Deuses, os ‘Supremos’.
Os elementares vem ao mundo para serem muito humanos! O tipo
de matéria humana que os criadores realizaram sorrindo...aqueles que a quem chama, em
particular, de ‘amigo’.
Uma curiosidade: é com eles que os “Supremos’’ gostam
de sentar para saber como é experienciar detalhes curiosos da experiência
humana: as doçuras e lanhuras da paixão, as histórias de um Estado em
Construção, as piadas sujas e limpinhas tecidas no meio fio de uma mesa de bar
entremeada quase ao meio fio e até, pasme, as linhas edificantes e edificáveis
das mesas dos meritíssimos e veneráveis.
Claro, os Supremos não são afeitos a estas ultimas coisas,
construídas pela mente humana. Mas, os elementares, quando as compõe, fazem
dessas uma experiência de partilha, humildade, conhecimento e entusiasmo, e o
entusiasmo genuíno encanta qualquer tipo de consciência e onisciência. ...
Ah! Os elementares, por aqui chamados de ‘gente macia’.
Gente macia não gosta de palco, não faz alarde, não
apresenta títulos: antes, contribui com o aprendizado, é discreto na fala e
gigante no doar tímido que compõe toda partilha confortável. Gente macia, do
tipo que a gente de sente confortável em enviar um poema, em deixar a pele da
alma à ‘mostra’, sabendo que não receberá de volta nada dolorido...Gente macia
nos faz rir de uma piada pronta ou criada naquele momento, mas sabe piada
bacana? Aquela em que todo mundo ri?...ou que, quem não ri é meio abestado?
Gente dessa natureza - os elementares - a gente vai contar no único dedo da mão às vezes,
e mesmo assim precisa agradecer ao infinito pela graça do PRESENTE.
Presente que, de tão real, jamais ‘foi’, mesmo quando se
ausenta - pois os elementares integram-se à matéria tocada: é impossível não
tocar em um elementar e não cair de afetos e ser alterada por sua consubstancialidade
com o Universo: Um elementar é parte do todo.
Dito isso, é impossível que se diga ‘foi’.
Eu preciso confessar a você, caro leitor: Eu conheço um
elementar.
E o que eu conheço é feito de tudo aquilo que
disse acima, e guarda suas peculiaridades: Foi feito de matéria amazônica, dos
muitos sóis do equador. É composto das sombras do solstício, do cio e do ócio da
linha que nos divide em metades, das borboletas e ipês amarelos que enfeitam a
JK todo insano setembro e que dançam suas flores pela Universidade Federal do
Amapá...
Por isso, digo e reafirmo: Deve ter havido algum engano,
porque em algum lugar do planeta, dizem por aí que um ser elementar mudou de
rota: saiu de um espaço existencial para outro, sem deixar de ser e estar.
Mas eu o vejo ainda hoje, pois em pleno Outubro, faz um sol
macio e uma borboleta amarela dança, livre pela JK.
#
Saiu das linhas dessa crônica molhada de teimosa água:
Um grande abraço, Fernando.
O engano, tu sabes e eu sei, é certamente uma brincadeira, um conto surreal teu com essa grande charada, e os personagens somos todos nós. Que bom
que eu sou aquela que, na tua escrita, sabe que, por seres elemento vivo da
Amazônia, segues conosco. E tem muitos outros, tocados pela tua
existência, que também sabem.
Eu vou sentir saudades, por um tempo...depois,vou amar te
reencontrar.
(P.s: ''Deve ter havido algum engano'' é uma variação de uma das traduções de 'O Processo', de Kafka, que emprestei, pois parece muito surreal ou absurdo. Esse conto não está revisado, pois estou 'lua velha', empalidecida e empalidecendo e sem todas as letras que moram dentro da boca e da alma...)